12 julho 2006

Transamerica

Há algum tempo, eu estava assistindo o programa vespertino do Clodovil, quando ele, num de seus não tão raros momentos de extrema lucidez, disse algo sobre o drama de uma travesti tomando banho: ela se olha no espelho e vê uma mulher perfeita, peitos, cabelo, e todo o resto, mas olha para baixo e vê que existe algo a mais. Aquilo realmente me tocou. Todos nós nos consideramos pessoas incompletas; temos nossos altos e baixo, nossos dramas e conflitos. Agora, imaginem não conseguir fugir desse conflito nunca. Imaginem como deve ser ter uma parte do seu corpo sempre a lhe lembrar que algo está errado; que você não pertence ao mundo; que você não se encaixa?

Bem, esse foi um assunto que me fez pensar um pouco na época, mas que já estava adormecido em meio a confusão da minha cachola (out of the chaos of my doubt), até ontem, quando eu assiti a dois filmes: Transamerica e Café da Manhã em Plutão.

O primeiro, e melhor dos dois, conta a história de um(a) transexual, as vesperas da operação de troca de sexo, que descobre ter um filho adolescente e problemático do outro lado dos EUA e é forçado(a), pela sua terapeuta, a ir encontrá-lo, e resolver esse problema antes de realizar a operação. A história é extremamente dramática, mas não chega nem aos pés de Magnólia em termos de choradeira e sofrimento. Em vez das personagens serem escravas da culpa e das maldições do passado, enfrentam tudo com um maravilhoso senso de humor, que somente gente com problemas de verdade pode ter. Destaque para a cena da lanchonete no meio do nada.



O segundo filme, não tão bom, mas mesmo assim divertidíssimo, nos apresenta Santa Gata (Saint Kitty), uma transexual irlandesa filha de um padre e da Dama das Sombras (Shadow Lady, não confundir com Queen of Shadows), sua maior inspiração e busca. Abandonada pelos dois, Gata vive com uma mãe adotiva e uma irmã rabugenta. Cresce ao lado de um grupo bem peculiar de amigos (incluíndo um garoto com Sindrome de Down) e descobre que, as vezes, a gente é simplesmente diferente. Café da Manhã em Plutão é um filme que trata dos sonhos de um ser humano, da luta diária por "fazer parte", de se conhecer e acreditar em si mesmo. Chego até a visualizar Santa Gata como uma Amélie Poulain transexual.



Pronto, a dica está dada. Dois ótimos filmes, sobre assuntos complicadíssmos, abordados de uma maneira leve e descontraída. Ainda temos muito o que aprender com o pessoal GLBT, mas eu ainda acreito que os HT algum dia aprendem. Ah sim... algum dia.

7 Comments:

Anonymous Anônimo disse:

Mário, um outro filme nessa mesma linha tão bom quanto Transaméria é Má Educação. Vc deveria assistir.

Quanto ao heteros terem muito que apreender com os gays, eu discordo. Acho q em questão de crise de identidade e auto-conhecimento estamos empatados...

Áisse!

quarta-feira, 12 julho, 2006  
Anonymous Anônimo disse:

indies

quarta-feira, 12 julho, 2006  
Blogger jan disse:

Texto muito bem escrito, como sempre... Mas, vc já parou pra pensar que o que vc aponta é apenas uma parte de um grande mundo racista, "classista", preconceituoso, egoista e indiferente?

Ah, quanto ao Transamérica: nada como encararmos nossos medos e nossas falhas, não é??
E, eu ACHO, que o problema não está em nós nos sentirmos desajustados no Mundo, mas sim quando nos apontam e nos excluem, automaticamente nos rotulando... Odeio rótulos.

Por fim, todos têm que aprender com todos... Tem muito gayzinho mais preconceituoso que muito hétero por aí, viu??

;*

quarta-feira, 12 julho, 2006  
Anonymous Anônimo disse:

Sempre conto essa história quando surge esse assunto: Quando era pequena, acreditava que meninas podiam ficar com meninas e meninos com meninos, que era só "amar". Não fazia diferença entre gostar de meninos ou meninas, até perceber isso no prézinho e aí acostumei.

Mas a questão não é tão simples assim, tem o conflito na cabeça, principalmente dos transexuais, que é esse "estranhamento" entre corpo e mente... que eu não sei descrever, mas que percebe-se ser muito DESTRUIDOR na vida de pessoas que não têm apoio da família nem amigos...

quarta-feira, 12 julho, 2006  
Anonymous Anônimo disse:

qq coisa pode ser destruidora qnd nao se tem apoio
crise de identidade nao envolve só sexualidade

quinta-feira, 13 julho, 2006  
Blogger Bruna disse:

Susgestões acatadas.

Sabe, Marinho, como já falamos a respeito, eu costumava ser uma militante gay, até que eu percebi que eu lutava tanto contra o extremismo que acabei me tornando extremista tbm.

Tem-se mto o q aprender com o GLBT, assim como o GLBT tem a aprender com HT. E diria mais, diria que na real, só o que precisamos praticar é alteridade. Se não reconhecermos e respeitarmos o outro, nada adianta de nada.

Mas a alegria do mundo homo é algo plausível.

quinta-feira, 13 julho, 2006  
Blogger Leósias disse:

O lance é beijar na boca e ser feliz.

E tenho mais dois filmes para a lista "filmes q verei um dia"...

sexta-feira, 14 julho, 2006  

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